Carlos Chagas


Quando Alberto Santos Dumont — nascido no dia 20 de julho de 1873, em Palmira, cidade da Zona da Mata mineira —, no dia 12 de novembro de 1906, em Paris, na França, decolou com o 14-bis, não poderia imaginar que aquele voo de apenas 220 metros deixaria um legado de inovação que permaneceu, ao longo do tempo, nas aeronaves e nas tecnologias desenvolvidas atualmente. Dumont foi um homem à frente de seu tempo que, inspirado pelo escritor Júlio Verne, na infância, deu origem a uma indústria bilionária, que deve lucrar US$ 9,8 bilhões em 2023, segundo estimativa da Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreo), e que, apenas no Brasil, em 2022, segundo dados da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), movimentou mais de 82,2 milhões de passageiros.

O pioneirismo de Santos Dumont é motivo de orgulho para todos nós, brasileiros. O seu legado repercute, até hoje, na qualidade e segurança da nossa aviação, com indicadores operacionais e de pontualidade e regularidade comparados aos melhores mercados do mundo, transportando milhões de pessoas todos os anos, destaca a presidente da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), Jurema Monteiro. “A aviação brasileira nos permite conectar todo o país, de norte a sul, e com o mundo, interligando mais pessoas e cargas por um território que é imenso e com muitas localidades que só são acessadas por meio do avião. Essa invenção gerou uma indústria que torna o turismo, os sonhos e os negócios possíveis em todo o Brasil, tendo valor inestimável para a indústria.”

Monteiro ainda lembra que a aviação brasileira é um grande motor da economia brasileira e, nos últimos 20 anos, o setor teve uma grande expansão por causa de medidas como a liberdade tarifária e de rotas, saltando de R$ 30 milhões para R$ 100 milhões por ano. “Do ponto de vista econômico, o transporte aéreo contribui decisivamente para a economia brasileira seja diretamente, seja catalisando outros setores econômicos, como o turismo, em que grande parte das atividades não ocorreria se não fosse o transporte aéreo, que permite o deslocamento dos turistas nacionais e internacionais em viagens de lazer ou de negócios, estimulando empregos e o consumo nas localidades.” Jurema Monteiro ainda destaca que, considerando o conjunto de atividades diretas, indiretas, induzidas e catalisadas, “o setor aéreo contribuiu, em 2019, com R$ 103,4 bilhões de contribuição ao PIB (Produto Interno Bruto), 1,4 milhão de novos empregos, R$ 32,6 bilhões em tributos e R$ 42,9 bilhões em salários”, conclui.

O Brasil tem atualmente apenas três grandes companhias aéreas em atividade: Gol, Latam e Azul. Juntas, elas foram responsáveis por transportar 99,5% dos passageiros de avião no último ano, segundo dados da Anac. Além disso, o país possui a Embraer, um conglomerado transnacional brasileiro fabricante de aviões comerciais, executivos, agrícolas e militares, bem como de peças aeroespaciais, além de prestar serviços e suporte na área. A empresa tem sede em São José dos Campos, no interior do estado de São Paulo, e possui unidades no Brasil e no exterior. A Embraer é a terceira maior fabricante de jatos comerciais do mundo e líder absoluta no segmento de até 130 assentos.

Santos Dumont foi um filantropo e colocou suas invenções com a patente aberta pensando no aprimoramento dos seus inventos, destaca Maurício Velasque, auxiliar de pesquisa do Museu Aeroespacial do Rio de Janeiro (RJ). “A dedicação ao voar foi sua principal característica. Seu legado de invenções inspira até hoje a FAB (Força Aérea Brasileira), pois a indústria aeronáutica brasileira teve como patrocinadores as forças armadas. Os ideais de Santos Dumont de inovação e progresso são os mesmos do povo brasileiro. Com o resgate do legado de Santos Dumont, transformamos a aviação brasileira até hoje, a qual é respeitada no mundo todo”, conclui.


Evolução da indústria aérea

Passados menos de dez anos do voo de Dumont, em 1914, a primeira linha aérea regular começaria a operar na Flórida (EUA), entre St. Petersburg e Tampa, com hidroaviões. Cada voo levava apenas um passageiro, que teria de pagar US$ 5 pela viagem. Meses depois, começou a Primeira Guerra Mundial, que deu impulso à fabricação de aviões, que, inicialmente, eram aproveitados para espionar e atacar. Ao final do conflito, em 1918, modelos utilizados na guerra que sobraram foram vendidos pelos governos para empresários, que começaram a criar linhas aéreas. No entanto, as empresas pioneiras tinham problemas por falta de passageiros. A solução passou pela ajuda de governos, como o dos Estados Unidos, que contrataram as aéreas para transportarem correspondências.

Nos anos de 1920, vieram motores mais potentes e fuselagens mais elaboradas, feitas de alumínio em vez de madeira. Além disso, uma era de aventuras foi inaugurada com as primeiras travessias do Atlântico. Em 1922, os portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral viajaram ao Rio de Janeiro no hidroavião Lusitânia de Lisboa, em uma jornada de 79 dias. Cinco anos depois, em 1927, o americano Charles Lindbergh viajou sozinho de Nova York a Paris, em 33 horas e meia sem escalas. Ainda em 1927, começam a operar as primeiras companhias do Brasil, a Condor e a Varig, com voos no sul do país. Em 1929, já havia o trajeto Nova York-Rio-Buenos Aires. Na década de 1930, os aviões passaram a usar mais a tecnologia do rádio para se comunicarem entre si e com os controles aéreos. Em seguida, surgem modelos maiores, como o Douglas DC-3, capaz de levar 21 passageiros.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a produção de aviões disparou. Ao final do conflito, houve um novo boom da aviação civil. Na década seguinte, as companhias passaram a adotar aviões com motores a jato. Com a chegada de aviões maiores, foi possível tornar as passagens mais acessíveis. Em 1964, a Boeing lançou o 737, o modelo mais bem-sucedido da aviação comercial e ainda em produção, que é capaz de levar mais de 200 passageiros. Logo depois, a empresa lançaria o 747, conhecido como Jumbo, capaz de levar mais de 400 viajantes e de cruzar continentes. Nas últimas décadas do século 20, os aviões comerciais ganharam mais sistemas de automatização e motores mais econômicos, como o 777, capaz de cruzar continentes e operando somente com dois motores em vez de quatro, utilizados pelo 747.


O 14-bis

O 14-bis foi primeiramente constituído por um aeroplano unido ao balão 14. A partir daí, surgiu o nome "14-bis". O balão servia para reduzir o peso efetivo do aeroplano e facilitar a decolagem. O primeiro teste do avião foi em 19 de julho de 1906. Em 23 de agosto, o 14-bis foi testado sem o balão. Na segunda tentativa, o aeroplano elevou-se do chão e voou. No dia 3 de setembro de 1906, foi colocado, no 14-bis, um motor náutico Antoinette de 50 cavalos-vapor no lugar do motor de 24 até então utilizado. Transformou-se o 14-bis, assim, no Oiseau de Proie, com o qual alcançou um salto de 11 metros em 13 de setembro de 1906. Porém, um pouso ruim afetou a estrutura e o motor do avião, cessando os testes.

Em 23 de outubro de 1906, no campo de Bagatelle, em Paris, o Oiseau de Proie II, após várias tentativas, viajou 60 metros em sete segundos, a uma altura de aproximadamente dois metros. Essa proeza contou com a presença da Comissão Oficial do Aeroclube da França, entidade internacional autorizada a homologar qualquer evento significativo tanto no campo dos aeróstatos como no dos "mais pesados que o ar". Novamente, um pouso brusco danificou as rodas do avião. O 14-bis ainda não era controlável. Em 12 de novembro do mesmo ano, finalmente, o avião percorreu 220 metros em 21,5 segundos, estabelecendo o recorde de distância da época. O feito foi registrado pelo Aeroclube da França. Em 4 de abril de 1907, o 14- bis realizou seu último voo. Após tentativas frustradas de estabilizar a aeronave, Santos Dumont perdeu o controle e bateu contra o chão. Ao invés de reparar o avião, ele preferiu utilizar as peças em outros projetos.

Coração guardado

O coração do pioneiro da aviação está preservado e exposto em um museu do Rio de Janeiro. Ele faz parte de uma das exposições permanentes do Museu Aeroespacial, no Rio de Janeiro. O item está conservado em uma redoma de metal e fica exposto no segundo andar do local.

Outras invenções de Santos Dumont

Balão livre "Brasil" – trocou a seda chinesa por um modelo japonês mais leve e resistente.

Esqui mecânico – era uma mochila utilizada nas costas que continha um motor e uma hélice.

Catapulta salva-vidas - a máquina lançava boias ao oceano para auxiliar no resgate de banhistas que estivessem se afogando.

Relógio de pulso – como os relógios de bolso eram usados para marcar o tempo, Dumont precisava de algo que não o fizesse perder tempo. Com isso, aconselhou ao amigo Louis Cartier, sobrenome que batiza uma das maiores grifes francesas de acessórios, que desenvolvesse um relógio que ficasse preso ao pulso.

Pioneiro do domínio público - o pequeno avião Demoiselle teve seus dados técnicos publicados em jornais da Europa, dos Estados Unidos e da Argentina.


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