Para que um transplante de coração seja bem-sucedido, o órgão deve sair do doador e chegar ao receptor em menos de seis horas. Sem irrigação sanguínea, um fígado não dura mais que 12 horas. É uma corrida contra o tempo, cujo sucesso depende fundamentalmente da agilidade do transporte. Por terra ou água, seria muito difícil. Por isso, os órgãos doados voam. E 90% desses deslocamentos ocorrem graças ao programa Asas do Bem, que congrega esforços das companhias ligadas à Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas).
O programa ajuda a salvar vidas desde 2014, quando se colocou à disposição do Sistema Nacional de Transplantes. Não importa a hora do dia, as Opos (Organizações de Procura de Órgãos) monitoram possíveis doadores em nível municipal. Uma vez constatada a morte encefálica de um paciente, o sistema é acionado, e o cronômetro começa a correr. É um desafio de logística mobilizar profissionais de saúde e de transporte em tempo hábil.
“Existe só uma fila, e ela é nacional. Por exemplo, alguém em São Paulo está precisando agora de doação e é compatível com um órgão que está em Brasília. Precisamos levar esse órgão antes que ele não seja mais utilizável. Então, você pega o órgão, leva-o para o aeroporto e o entrega nas mãos do piloto da aeronave que estiver na pista. Ele levará o órgão com prioridade total para chegar em tempo de ser transplantado”, explica Alexandre Barroso, com simplicidade.
Barroso, no entanto, fala com total conhecimento de causa. Ele foi salvo por esse serviço, que integra o SUS (Sistema Único de Saúde) e é totalmente gratuito. O publicitário sobreviveu a três procedimentos de transplante (dois de fígado e um de rim), 11 cirurgias e diversos estados de coma. Sua história admirável de superação foi recontada mais uma vez nessa terça-feira (23), no auditório do Hospital de Base de Brasília, durante o Congresso de Emergências Médicas.
“Às vezes, você está em um voo que atrasa. Você pensa: ‘Que saco, vai demorar’. Na maior parte das vezes, essa demora é porque a aeronave está aguardando uma central de transplantes, que pode chegar a qualquer momento com um órgão que vai salvar vidas”, alerta Barroso. “Então, esse é um trabalho muito bonito das empresas aéreas particulares e da FAB”, enfatiza. A Força Aérea Brasileira também é parceira na iniciativa.
O evento ocorrido no Hospital de Base teve um momento de grande emoção: o reencontro de Alexandre Barroso com um dos médicos da equipe que realizou seu primeiro transplante em 2010. Naquela época, o cirurgião Luiz Gustavo Guedes Dias fazia residência no Hospital Albert Einstein e acompanhou o transplante do publicitário. Hoje, ele atua em Brasília, onde se especializou em transplante de fígado. Os dois não se viam desde então.
“Com o fígado, a gente tem 12 horas entre a retirada do doador e o implante, de modo que o procedimento tenha viabilidade técnica. A gente depende muito do transporte nesse processo. Aqui, em Brasília, você tem a facilidade da posição geográfica (que permite chegar a diversos lugares do país) e dispões de várias empresas de voo comercial, que são fundamentais. Às vezes, até atrasam um pouco o voo para permitir que a gente chegue e consiga transportar os órgãos com segurança”, testemunhou o médico.